quinta-feira, setembro 30, 2010

Fala-nos da Liberdade

Às portas da cidade e em vossos lares, eu vos vi prosternar-vos e adorar vossa própria liberdade,
Como escravos que se humilham perante um tirano e glorificam-no embora os destrua.
Sim, na alameda do templo e à sombra da cidadela, tenho visto os mais livres dentre vós carregar sua liberdade como um jugo e um grilhão.
E meu coração sangrou dentro de mim; pois só podereis libertar-vos quando até mesmo o desejo de procurar a liberdade se tornar um jugo para vós, e quando cessardes de falar da liberdade como de uma meta e de um fim.
Sereis, na verdade, livres, não quando vossos dias estiverem sem preocupação e vossas noites sem necessidades e sem aflição,
Mas, antes, quando essas coisas sobrecarregarem vossa vida e, entretanto, conseguirdes elevar-vos acima delas, desnudos e desatados.
E como vos elevareis acima de vossos dias e de vossas noites se não quebrardes as cadeias com que, na madrugada de vossa compreensão, prendestes vossa hora meridiana?
Na verdade, o que chamais liberdade é a mais forte destas cadeias, embora seus anéis cintilem ao sol e vos deslumbrem.
E que quereis rejeitar para serdes livres, senão fragmentos de vós próprios?
Se é uma lei injusta que pretendeis abolir, lembrai-vos de que esta lei foi escrita por vossa própria mão em vossa própria testa.
Não conseguireis extingui-la, queimando vossos códigos nem lavando as faces de vossos juízes, embora despejeis o mar por cima delas.
E se é um déspota que quereis destronar, verificai primeiro se seu trono erguido dentro de vós está destruído.
Pois como poderia um tirano dominar os livres e os altivos se não tivessem tirania na sua própria liberdade e vergonha na sua própria altivez?
E se é uma preocupação que quereis eliminar, essa preocupação foi escolhida por vós mais do que a vós imposta.
E se é um temor que precisais dissipar, o centro desse temor está em vosso coração e não na mão do temido.
Na verdade, todas as coisas movem-se dentro de vós em constante meio enlace, as desejadas e as receadas,  aquelas que vos repugnam e aquelas que vos atraem, aquelas de que fugis e aquelas que procurais.
Essas coisas movem-se dentro de vós como luzes e sombras em pares estreitamente unidos.
E quando a sombra se desvanece e se dissipa, a luz que se demora torna-se a sombra de uma outra luz..
É dessa maneira que vossa liberdade, quando perde seus entraves, transforma-se num entrave para uma liberdade maior.

no livro O Profeta de Khalil Gibran